Cesar Vanucci *

“A democracia é nosso chão.”
(Manifesto assinado por “presidenciáveis centristas”)

Apesar de a pandemia, com sua estatística lúgubre, monopolizar, nesta hora, as atenções, ou, talvez, até pelo contrário, devido mesmo à circunstância deste flagelo humanitário assumir, a cada momento que passa, feição mais assustadora, os setores políticos acharam conveniente adentrarem logo a cancha e antecipar as confabulações pré-eleitorais mirando a sucessão presidencial ano que vem.

Tendo como signatários personagens tidos, na percepção de observadores da cena pública como “presidenciáveis”, o “Manifesto pró-democracia”, vindo a lume, constitui lance relevante nas manobras do tabuleiro de xadrez da campanha do pleito ainda distante. Dá, sem dúvida notícia destacada da efervescente movimentação dos arraiais partidários. Deixa expresso, antes de tudo mais, que a dolorosa questão do coronavírus será tema fulcral dos debates na televisão, palanques, nos papos de rua em todo percurso da retórica eleitoral. A outra conclusão extraída do pacto que acaba de ser firmado por algumas influentes lideranças é de que existe, no seio da comunidade, apreciável corrente de opinião desejosa de incluir na disputa uma candidatura a chefe de governo com características renovadoras, profissão de fé “centrista”, afastada prudentemente das lateralidades ideológicas extremadas. O esquema se aplica, obviamente, às governanças regionais.

O entendimento dos autores do manifesto é de que o Brasil quer se ver livre da polarização que prevalece, de há muito, no cenário em que se desenrolam acesos debates das questões nacionais. O entre choque retórico ficaria absorvido, dentro dessa linha de raciocínio entre grupos apontados como da direita e da esquerda. Uma polarização, acentuam eles sumamente danosa ao interesse nacional. Daí a proposta que trazem ao exame da sociedade, num memorial onde alegam estar deixando de lado ocasionais divergências e interpretações diferenciadas dos problemas políticos e administrativos, de uma terceira via quanto à próxima disputa presidencial. Nessa altura das considerações, os responsáveis pela divulgação do documento arguem a hipótese de que a indesejada polarização colocaria, frente a frente Bolsonaro como candidato da direita e Lula como candidato da esquerda. Os “presidenciáveis sustentam a possibilidade de aglutinar forças dos assim chamados “centros”, “centro esquerda e centro direita”, ganhando com isso chances de garantir a subida na rampa do Palácio do Planalto, o candidato que venha a ser por eles consensualmente lançado.

“A conquista do Brasil sonhado por cada um de nós não pode prescindir da Democracia. Ela é nosso legado, nosso chão, nosso farol. Cabe a cada um de nós defendê-la e lutar por seus princípios e valores. Vamos defender o Brasil”, diz o manifesto. Assinam o documento os ex-ministros Luiz Henrique Mandeta, do DEM, até outro dia responsável pela pasta da Saúde do atual governo; e Ciro Gomes, do PDT, que se candidatou em 2018; o governador de São Paulo, João Doria; o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, ambos do PSDB; o candidato do Novo no último pleito, João Amoêdo, e o apresentador de televisão Luciano Huck, frequentemente mencionado em listas dos chamados “presidenciáveis”. Existem informações de que o ex-ministro e ex-juiz Sergio Moro participou, num primeiro momento, da elaboração do manifesto, mas preferiu não apor sua assinatura no texto divulgado.
Nas ações desencadeadas pelo “time da terceira via” não passaram despercebidas ao arguto olhar dos analistas políticos, três situações em especial. O grupo consultou o ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso, a propósito da posição tomada. Nos depoimentos dos signatários, as críticas mais inflamadas têm como alvo o governo Bolsonaro. Embora o ex–Presidente Lula haja manifestado interesse na formação de uma coalisão de forças oposicionistas, os signatários do pacto não o convidaram a dele fazer parte.

* Jornalista (cantonius1@yahoo.com.br)