Marília Alves Cunha*

As crianças correm pelo quintal em ruidosa agitação. Corpos inquietos, energia a supitar pelos poros, carinhas manchadas de rouge pelo calor da excitação. Um bando de periquitos corta os ares em revoada barulhenta, asas batendo vigorosas, massa verde tingindo o céu de agosto. As crianças agitam-se mais, gritam,correm, alçam os braços como se quisessem também voar, alcançar as alturas, atingir com um abraço quente as criaturas do alto. Crianças e pássaros se parecem nos seus arrulhos, na sua ânsia de liberdade, na agitação que de repente se põe em calmaria. Asas e braços se fecham, o alarido do dia dá lugar ao silêncio do entardecer.

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Alguns pássaros constroem ninhos engenhosos. O beija flor, por exemplo. Maravilha de técnica e engenharia. Outros são um tanto quanto relapsos na construção da morada. Aproveitam-se de material de fácil acesso e não têm grandes preocupações com a segurança do lar. E foi um destes casaizinhos tranquilos que se ajeitou num arbusto na casa do meu filho. O amor frutificou em adoráveis filhotinhos. Resultante de péssima edificação do abrigo, construído sem capricho, deu no que deu: um dos filhotes caiu do ninho, em cima da grama do jardim. Meus netos apavorados correram a gritar: “Papai, venha depressa! O passarinho caiu do ninho, corre papai!” O pai, com sua habitual calma, pegou delicadamente o filhote frágil e trêmulo e o colocou de volta. As crianças deram pulos de alegria, vibraram de felicidade. O salvador foi o herói do dia. Nos pequenos e sensíveis gestos se fazem heróis e marcam na memória instantes magníficos de amor e compaixão.

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Reparem os pássaros nas preliminares do acasalamento. Exercício puro de sedução! A fêmea mostra-se tímida, como mocinha indecisa entre o pudor e o desejo, relutante em entregar-se por inteiro ao apelo do sexo. O macho se expande em sexualidade, voa em torno, bica (ou beija?), tenta prendê-la a si, como se não fosse mais possível deixá-la. Aos poucos a dama cede excitada aos avanços do pássaro, aceita, aquieta-se junto ao amado. Ele infla orgulhoso. Conquistou, apossou-se por inteiro do coração da donzela. Final feliz terá a história de amor, do jeitinho que as crianças gostam. História coroada por lindos filhotinhos e tudo mais que a natureza e o ser humano lhes permitir.

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Dia desses assisti na TV um ambientalista otimista bendizendo o sumiço dos estilingues e arapucas, creditando o fato ao alvorecer de uma nova consciência. Assim espero. Que o planeta seja um lugar tranquilo e verdejante para os pássaros. E que as crianças sejam felizes, plenas de liberdade e não percam nunca o ar curioso, o sorriso fácil e a beleza da inocência. Em meio ao agito da vida, que mantenham um olhar atento e límpido, apto a perceber e admirar os espetáculos que a natureza oferece. Digam amém os anjos!

*Educadora e escritora – Uberlândia – MG