Ana Maria Coelho Carvalho – Bióloga – Uberlândia – -anacoelhocarvalho@terra.com.br

Tenho vasta experiência em histórias e cantigas de ninar. Foram anos e anos tentando fazer crianças dormirem (filhos, netos, sobrinhos). Só quem passou pela experiência sabe como é. Muitas vezes, embalados pelas cantigas, dormimos e a criança fica acordada. Ou, sonolentos, contamos a história toda errada, causando indignação na criançada.
Mas pior mesmo é quando a criança dorme no colo e não tem como colocá-la na cama. Parece que a cama tem espinhos. Sempre me lembro de uma história verídica sobre isso, publicada na revista Seleções, com fotos dos personagens. O pai fazia tanto malabarismo para colocar a criança na cama sem acordá-la, que um dia emaranhou-se todo, caiu, bateu o cotovelo no chão e quebrou o braço. Com um braço só, a missão ficou mais difícil. Caiu outra vez e quebrou o outro braço. Recentemente, também assisti a um vídeo de um pai que, após várias tentativas fracassadas de colocar uma menininha no berço, resolveu entrar no mesmo e ficar lá com ela, que se aninhou em sua barriga e dormiu. Essa tática eu não conhecia…
Nessa missão, às vezes impossível, as histórias infantis e as canções de ninar tem papel relevante. Por exemplo, uma vez minha sobrinha, então com sete anos, pediu-me para contar histórias para ela dormir. Sugeri Branca de Neve, Rapunzel ou a Bela Adormecida. Ela disse que não queria histórias de medo, tinha pavor de bruxas. Pensei então no Patinho Feio. Também não serviu, era muito triste, ela ficava com pena do patinho. Optamos pela Festa no Céu, aquela em que o sapo entra no violão do urubu.
Realmente, existem histórias e cantigas estranhas. Em “João e o pé de feijão”, o Joãozinho é mau caráter, rouba a galinha dos ovos de ouro e a harpa do gigante. Pra completar, corta o pé de feijão para o gigante se esborrachar no chão. O Gato de Botas também não é lá muito honesto, engana o gigante e fica com seu castelo.
Aliás, existe sobre isso um texto bem humorado de dois meninos conversando. O primeiro menino conta que estava chateado com a mãe, pois ela andava com uns papos estranhos, disse que a cuca vinha pegar. Ele nem conhecia esta cuca, não tinha feito nada e a cuca vinha pegá-lo? O pior é que entendeu que quando a cuca viesse, estaria sozinho, pois o pai foi pra roça e a mãe foi passear. Como a mãe foi passear, se ela estava ali bem na frente, cantando? Será que ele era adotado? Se fosse, era até melhor, pois ficou sabendo umas coisas estranhas da mãe. Ela disse que pegou um pau e atirou no gato. Quanta maldade! O segundo menino perguntou por que será que sua mãe tinha feito isso. O primeiro respondeu que ela era perturbada. E pior, parece que a mãe estava traindo o pai dele, pois ela disse numa boa, cantando, que lá no bosque, no final da rua, tinha um cara que devia ser bonitão, pois ela o chamava de Anjo. O tal Anjo roubou o coração dela. E se fosse a dona da rua, mandava colocar ladrilho em tudo, só para o Anjo passar desfilando. Completou que achava que a mãe também não gostava dele, pois começou a chamar um boi de cara preta pra levá-lo embora, fazendo um monte de caretas. O segundo menino, que escutava boquiaberto, concluiu: -“Nossa, “véio”, com certeza ela não é sua mãe, nunca uma mãe ia fazer isso com o filho!”.
As histórias e cantigas ficam mesmo na imaginação das crianças. Prova disso foi o menininho que estava comigo certo dia, no museu da UFU, olhando encantado para o lobo guará taxidermizado. De repente, saiu de fininho e começou a olhar pra todo canto. Perguntei o que estava fazendo e ele respondeu: -“Procurando os três porquinhos”.