Ivan Santos – Jornalista
A quem quiser aprender a escrever com arte, o escritor alagoano, Graciliano Ramos ensinou:
“Deve-se escrever da mesma maneira como as lavadeiras lá de Alagoas fazem seu ofício. Elas começam com uma primeira lavada, molham a roupa suja na beira da lagoa ou do riacho, torcem o pano, molham-no novamente, voltam a torcer; colocam o anil, ensaboam e torcem uma, duas vezes. Depois enxaguam, dão mais uma molhada jogando a água com as mãos. Batem o pano na laje ou na padra limpa e, dão mais uma torcida, e mais outra; torcem até não pingar do pano uma só gota. Somente depois de feito tudo isto é que elas dependuram a roupa lavada na corda ou no varal, para secar. Pois quem se meter a escrever devia fazer a mesma coisa. A palavra não foi feita para enfeitar; a palavra foi feita para dizer”.
O jornalista Armando Nogueira contava uma história pitoresca:
“Um homem chega a uma feira e lá encontra seu compadre arrumando peixes num tabuleiro. Cumprimentam-se. O feirante está contente com o sucesso do seu modesto comercio. Entrou no negócio há poucos meses e já pôde até comprar um quadro-negro para badalar seu produto. Atrás do balcão, no quadro-negro, está a mensagem escrita a giz em letras caprichadas: “Hoje vendo peixe fresco”. O feirante, então perguntou ao compadre:
– Você acrescentaria mais alguma coisa? O compadre releu o anúncio. Discreto, elogiou a caligrafia. Depois perguntou ao feirante:
– Você já notou que todo dia é sempre hoje? E acrescentou:- Essa palavra “hoje” está sobrando. O feirante aceitou a ponderação e apagou o adverbio. O anúncio ficou mais enxuto: “Vendo peixe fresco”.
– Se o amigo me permitir – tornou o visitante- eu gostaria de saber se aqui nesta feira existe algum peixe é dado de graça.
– Que eu saiba, não.
-Então acho desnecessário o verbo “vender”. Se a banca fosse minha, eu apagaria o verbo. O anuncio encurtou mais um pouco e ficou: “PEIXE FRESCO”.
-Me diga uma coisa – acrescentou o visitante – por que apregoar que o peixe é fresco? O que traz o freguês a uma feira no cais do porto é a certeza de que todo peixe aqui, é fresco. Lá se foi também o adjetivo. Ficou o anúncio reduzido a uma singela palavra: PEIXE. Mas por pouco tempo, pois o feirante pondera:
– Até um cego percebe que o assunto, aqui, é pescado…
E o substantivo foi apagado. O anuncio sumiu. O quadro negro também. O feirante vendeu tudo. Não sobrou nem a sardinha do gato. Sobrou apenas a lição: escrever bem é cortar no texto as palavras desnecessárias.