Antônio Pereira da Silva*

Na segunda metade do ano de 1978, apareceu por aqui o sr. Charles Borer que veio descansar um pouco pescando lambaris e caçando passarinhos numa das fazendas do nosso saudoso prefeito Virgílio Galássi. Apesar do nome afrancesado, a nossa personagem era ligada ao futebol, presidente do Botafogo do Rio de Janeiro, e tinha alguma satisfação que dar aos nossos esportistas. Talvez por isso, foi convidado para um jantar no Praia Clube onde acabou tendo que prometer de pés juntos e mãos postas, um novo amistoso entre o Botafogo de Futebol e Regatas e o Uberlândia Esporte Clube para tirar a má impressão que o time da estrela solitária deixara numa disputa acontecida no primeiro semestre.
Foi no dia 5 de março.
O Presidente do UEC era o dr. José Aparecido Martins.
O Juca Ribeiro esteve com os portões fechados por algum tempo para concluir obras do lado da rua Cruzeiro dos Peixotos. Pretendiam reabri-los com uma série de grandes jogos. Entre os times preferidos para serem convidados estavam o Corinthians, o Vasco e o Flamengo.
Veio o Vasco, por 250 mil cruzeiros. O estádio superlotou: mais de 20.000 pessoas viram o time da cruz de malta enfiar três gols no UEC. Mas isso é outra história.
Em seguida veio o Botafogo para mais um confronto desequilibrado. O Bota vinha de uma série de mais de 20 jogos invictos que ainda estendeu para mais de 40. O Uberlândia estava numa fase regular, ganhava de um, apanhava de outro, de vez em quando, um empate.
Na preliminar enfrentaram-se o time “B” do Uberlândia e o Vitória do Espírito Santo. O jogo terminou como começou: zero a zero.
O técnico do Uberlândia era o Neiriberto (recentemente falecido), que tinha sido atleta do clube – um marco e um símbolo do time.
As arquibancadas estavam lotadas. Mal começou o prélio, o UEC mostrou que superava a sua inferioridade e ameaçava a invencibilidade do seu glorioso rival. Vejam bem com que time o Botafogo jogou: Zé Carlos, Perivaldo, Osmar, Fred e China (Ademir); Luizinho (Wels) e Mendonça; Dé, Nilson Dias, Ademar (Mário Sérgio) e Paulo César (o Caju). Só dois titulares estavam ausentes: Rodrigues Neto e Gil, convocados para a Seleção Brasileira. Gil é aquele mesmo que foi ponta do UEC.
O juiz, ou árbitro se prefere atualmente, era o sr. Hélio Cosso, já falecido, da Federação Mineira e da CBD.
O jogo transcorreu bastante equilibrado com o Uberlândia comandando as mudanças do placar. Logo aos vinte e cinco minutos do primeiro tempo, fizemos nosso primeiro gol. Obra do Odair, recentemente chegado do Corinthians Paulista. No segundo tempo, o Bota veio com tudo, numa reação assustadora e logo aos quatorze minutos empatou com Nilson Dias. Foi alegria de curto prazo. Aos dezenove minutos, Ferraz desempatou de novo. Voltamos à frente: dois a um. Íamos tocando a coisa nesse diapasão de euforia, quando o endiabrado e irreverente Dé, empatou de novo aos trinta e cinco minutos. O Botafogo, para não quebrar a série de jogos sem derrota, resolveu segurar o resultado por aí. Bola pra lá, bola pra cá, o que deu oportunidade para o Uberlândia crescer e morar dentro da área dos cariocas. E vai aperto daqui e vai aperto dali, é marcada uma falta, próximo à grande área do Botafogo, pelo lado direito. Ferraz bate com violência e a bola é desviada por um toque de mão do Mário Sérgio (que foi também comentarista de TV e técnico). Hélio Cosso não teve dúvida: indicou a marca da cal – pênalti. Aos quarenta e quatro minutos do segundo tempo! Aí virou bagunça. E é, e não é, o juiz inflexível. Paulo César Caju, aquele enjoado (mas bom de bola), reuniu o time no centro do gramado, confabulou coisas que a gente nunca soube e, em seguida, dirigiu-se à beira do campo e passou o segredo para o consagrado Mário Lobo Zagalo que, incontinenti, tirou o time de campo. Foram vaiados, xingados, buchados, mas saíram. Indignado, o presidente Cidão pagou todas as despesas de responsabilidade do UEC, viagem, estadia, alimentação, etc menos a quota de 150 mil cruzeiros que depositou na FMF exigindo justificativas válidas do Botafogo para receber. Como não havia meio de justificar uma atitude tão insólita e antiesportiva, alguns meses depois, como consequência da promessa de Charles Borer, e principalmente para receber sua quota, o Botafogo voltou a Juca Ribeiro, completo, de graça, e enfrentou de novo o UEC vencendo-o por 2 a 0. Essa foi a lamentável passagem do “lobo fujão” por nossos gramados – uma mancha na bela série de vitórias do Botafogo e na vitoriosa carreira do nosso “formiguinha”.
O time que espantou o fujão foi: Ernâni, Geraldo (Macalé), Dias, Chico Amorim e Zezé; Carlos Alberto e Paulinho; Odair, Rubinho, Gil e Ferraz. Lembram? (Fontes: Jornais da época, José Ernani da Silveira e Dr. José Aparecido Martins)

*Jornalista e escritor – Uberlândia – MG – apis.silva@terra.com.br