Antônio Pereira*

Frei Egídio Parisi foi figura ímpar na história da cidade. A sua longa passagem por aqui gerou muitos casos curiosos. Caridoso, fazia uma festa cristã para os presos da cadeia da rua Tiradentes, todos os Natais. Num deles, quando entrava pelo corredor das celas, ouviu a gritaria de um conterrâneo berrando em italiano que estava preso injustamente, que não tinha feito nada. Que não era um criminoso. O frei se condoeu e foi pedir ao delegado que o soltasse, que não tinha feito nada. O delegado disse que não podia, a prisão tinha sido por decisão judicial em processo. Frei Egídio não se contentou, foi ao juiz. Fez lá suas alegações, baseadas nas queixas do preso, mas não adiantou nada. O juiz disse-lhe apenas que o cidadão estava preso porque tinha uma pena a cumprir e que ele já tinha fugido de umas vinte cadeias, mas, agora, ia cumprir a pena.
Frei Egídio redarguiu:
– O senhor não vai solta-lo, ele vai fugir de novo.
O juiz ergueu o indicador, balançou-o negativamente e afirmou seguro:
– Daqui, não!
Volta e meia o frei ia lá pedir a soltura do conterrâneo passando antes na cadeia para vê-lo. Recebia, sempre a negativa do juiz. Sentenciava o religioso:
– O senhor não vai solta-lo, ele vai fugir de novo.
E aconteceu. Uma noite, cinco presos furaram uma das paredes da cadeia e se mandaram. Entre eles, o Francesco Romano, “que não tinha feito nada”.
Pela manhã, mal chegara o juiz ao fórum, já estava lá o frei com o seu indefectível guarda-chuva. A notícia da fuga ainda não tinha chegado àquela casa. Frei Egídio foi conversar com o juiz e pedir mais uma vez a liberdade do seu protegido. E a conversa terminou quase do mesmo jeito que todas as outras.
– O senhor não vai solta-lo, ele vai fugir de novo.
– Daqui, não. – Respondeu enérgico o Juiz.
E o frei Egídio, que já sabia da fuga porque tinha passado antes na cadeia, sorriu galhofamente:
– Pois já fugiu!
O imbróglio não terminou aí.
Pouco depois da fuga, o Romano já estava de terno, gravata, num ônibus para o estado de Goiás, todo limpo e ajeitado. Desceu em Itumbiara e encontrou-se com o soldado que o havia prendido.
– Uai, que você está fazendo aqui?
– Cumpri minha pena. Estou livre.
O soldado cumprimentou-o pela liberdade e ainda o convidou para um cafezinho na rodoviária.
Francesco Romano não achou muito conveniente ficar por ali e, depois do cafezinho, tomou outro ônibus para qualquer lugar mais para os fundos de Goiás.
E não se soube mais dele.

*Jornalista e escritor – Uberlândia – MG