Shyrley Pimenta*

Nada melhor para curar as dores da alma do que doses diárias de literatura (aquela literatura boa e cem por cento pura). Um bom livro (atenção! Não estamos falando de autoajuda) pode ser um refúgio na crise, um mergulho fundo numa realidade mais plena, possibilitando um diálogo verdadeiro consigo mesmo e com o outro.
Sem dúvida, em se tratando de leitura, há os que preferem a agudeza crítica e mordaz de um Machado de Assis; há os que se deixam fascinar pelas passagens do tempo em Marcel Proust; há os que se aventuram na luta contra os moinhos de vento, e pegam carona na comitiva de Cervantes. Em todos eles uma certeza: a possibilidade de viver e reacender paixões, emoções, sentimentos e reflexões.
O livro é um amigo discreto, acolhedor, sempre à mão. Suscita em nós sensibilidade, prazer, as mais fortes emoções humanas. Não resta dúvida: a literatura é o caminho para o autoconhecimento. O saber do protagonista, do outro ficcional, nos fornece parâmetros na hora da dificuldade própria, da difícil escolha entre duas ou mais alternativas.
A relação que se estabelece entre autor e leitor é misteriosa, subjetiva. A identificação vai se fazendo, ora com um, ora com outro autor, pela via da razão, da emoção, das duas coisas entremeadas. O certo é que não dá para prescindir do livro, da leitura, esse alimento que nos sustenta a mente, a vida do espírito. Seja na dor, no prazer, na necessidade premente, ou na mais pura gratuidade, a literatura é sempre uma experiência estética, de elevação. Afinal, a literatura é um ombro amigo, é a própria vida traduzida em signos, letras e palavras.
Cético, o leitor poderá se perguntar: será mesmo verdade que os livros, a boa literatura, conferem valor e significado à vida? Um teste interessante para investigar a veracidade de tal assertiva é simples: introduzir grupos de leitura nas famílias, nas escolas, nas igrejas, nas prisões… São lugares propícios para se fazer uso contínuo e exaustivo de experiências de leitura, leitura de bons textos, de autores renomados, que possam promover a reflexão, o aprofundamento de ideias e, por tabela, acrescentar valor(es) à vida.
Uma herança que a modernidade nos deixou foi a cultura da pressa, da velocidade. Há que se fazer o máximo, no menor tempo possível. E haja afobação: nas tarefas domésticas, nas relações cotidianas (inclusive amorosas), na vida interior. Em boa hora, a leitura se coloca para nós como um momento propício para a desaceleração, pois seus efeitos benéficos só se fazem sentir quando se diminui o ritmo, quando se adentra as páginas do livro com corpo, mente e coração tranquilos, reflexivos.
A literatura pode ser um lenitivo para as dores da alma e do corpo. Em doses diárias, e de fonte segura, artística, criativa, sua eficácia é comprovada: ela transforma homens e mundos. A literatura pode ser, sim, um santo remédio. Experimente!

*Educadora e psicóloga clínica – Uberlândia – MG